quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

O ÚLTIMO DIA

Por Cleidson Arruda Araújo*


Acordou. Porém, permaneceu deitado e com os olhos fechados. Começou a  refletir depois de uma longa jornada anual de trabalho. Refletia sobre si  mesmo, sobre sua profissão, chegava mesmo à conclusão de que a profissão que escolheu o dava uma sobrecarga maior, mas gostava do que fazia, aliás, fazia com maestria, pois pensava que quando escolhemos uma profissão devemos nos entregar a ela assim como um adolescente se entrega a sua primeira paixão.

 Mas a reflexão a qual se dava estava muito longe de o satisfazê-lo, não por  não ter realizado o seu trabalho a contento, mas porque sabia que os humanos  nunca estão satisfeitos com seus feitos, com suas proezas. Sempre há algo mais a fazer, pensava. Talvez fosse a falta de uma auto-reflexão durante todo um ano que o fizesse pensar assim. O certo é que faltava algo e por causa disso, sofria. E sem hesitar, com os olhos fechados, aquele homem cansado de tanto dispensar sua vida durante longos anos à profissão que mais
 amava pôs-se a chorar. E chorou tanto que suas lágrimas o inundaram internamente ao ponto de afogarem sua própria alma. 

Chorou toda a sua raiva, toda a sua frustração, todo seu ódio e dissabores de uma vida que não é  fácil, de uma vida que se mostra permanentemente implacável com aqueles que a desafiam. Mas julgava o seu pranto necessário, pois a partir de então p assou a acreditar que nossas ações desde as que consideramos mais insignificantes devem ser precedidas de uma profunda reflexão. O homem que não se dá permanentemente à reflexão, pensava, é suscetível de cometer as  mais terríveis atrocidades. Convencido disso abriu os olhos, levantou-se e se dirigiu completamente despido à janela do seu quarto. Ao abri-la, a luz  do sol como que em resposta às suas angustias e inquietações começou a  banhar-lhe e, naquele momento a sentiu como ninguém a tivesse sentido antes, uma luminosidade de caráter especial. Permaneceu ali quase que sedado. Após alguns minutos se recompôs e, voltando à vida real só lhe restara dirigir-se ao encontro dos alunos para os quais ia ministrar o último dia de aula.






*Professor e Secretário Escolar da Escola Everaldo

Um comentário:

luciene disse...

Que bonito Cleidson, profundo. Parabéns!