Der Spiegel
Juliane von Mittelstaedt
A tribo Suruí da floresta tropical brasileira está lutando para impedir a destruição de sua terra natal. Mas em vez de arcos e flechas, ela está usando a Internet, GPS e o Google Earth. A seguir ela planeja negociar emissões de carbono.
O cacique Almir Narayamoga Suruí gira o globo diante dele, passando por Copenhague, Bristol e Washington. Ele adora navegar no Google Earth, pulando de um continente para outro. Isso se transformou em um vício. Eu pergunto qual é o interesse dele em Bristol. “Eu não sei”, ele responde. “Estou só olhando.” A Terra virtual diante dele continua girando e finalmente chega ao Brasil, e aqui o cacique de 35 anos, que nasceu no chão de uma cabana na floresta tropical, dá um zoom em um grande triângulo verde cercado por marrom, com as linhas tão nítidas como se desenhadas com uma régua.
“Esta é nossa terra: 2.428 quilômetros quadrados de floresta”, ele diz. Com quase três vezes o tamanho da cidade de Nova York, o triângulo de floresta é lar dos 1.300 membros da tribo Suruí, um dos vários milhares de grupos indígenas que vivem no Brasil. O local é chamado de Terra Indígena Sete de Setembro, o dia em que mundo do homem branco chegou ao dos suruís: 7 de setembro de 1969. Esse primeiro contato provou ser devastador, reduzindo a população de 5 mil para apenas 250 devido à combinação de fome, civilização e, acima de tudo, sarampo. Antes da modernidade entrar em suas vidas, os suruís permaneciam dentro dos limites de sua reserva e praticamente nunca deixavam a floresta.
Quarenta e um anos depois, o cacique Almir está sentado em uma casa verde no local do primeiro contato. Hoje ela fica na periferia da cidade de Cacoal, na Rodovia BR-364, no Estado brasileiro de Rondônia. O cacique é um homem baixinho e atarracado, com olhos pequenos e cheios de vida em uma cabeça que parece um matacão repousando entre seus ombros. Diante dele está um pequeno notebook preto. Atrás dele, na parede, está pendurada uma flecha decorada com penas.
Internet, Google Earth, GPS
É daqui que ele trava sua batalha contra o desmatamento em sua terra natal. Suas armas são a Internet, o Google Earth e GPS. Ele fala sobre imagens por satélite, sobre o milhão de árvores que ele pretende plantar e sobre os 16,4 milhões de toneladas de dióxido de carbono que pretende vender no mercado global de emissões.
Os suruís em breve serão um dos primeiros povos indígenas que serão pagos pelo mundo para preservar sua floresta. Eles estão sendo orientados por banqueiros de investimento, advogados e administradores. Mas são eles que tomarão suas próprias decisões, em um encontro de 1.300 índios. Almir Suruí acredita que seu povo precisa da modernidade para ajudá-los a manter seu modo de vida tradicional, que esta é a única forma de salvarem sua floresta, sua cultura e sua tribo. Mas por se tratar de uma experiência, o resultado é incerto –tanto para os suruís quanto para o restante do mundo.
A Bacia do Amazonas contém 40% das florestas tropicais do mundo. É a Amazônia que mostrará primeiro se a batalha contra o desmatamento e a mudança climática pode ser vencida. E também o que acontecerá em caso de derrota.
Apenas no ano passado, 130 mil quilômetros quadrados de floresta foram derrubados ou queimados, pelo menos 10 mil quilômetros quadrados disso no Brasil. Este pode ser o menor número em décadas, mas ainda é demais; 20% da floresta Amazônica já desapareceram. A mesma proporção foi danificada. Em uma escala puramente proporcional, a maior quantidade de floresta desapareceu no Estado de Rondônia.
Conflito com os madeireiros
A reserva Sete de Setembro sobreviveu como um triângulo verde confinado por fazendas, vilarejos e estradas. Ela sobreviveu porque os suruís expulsaram colonos e madeireiros, passaram correntes de ferro nas estradas e mudaram a localização de suas aldeias para melhor prevenir invasões em sua reserva. Mas 2.428 quilômetros quadrados é uma área vasta demais para 1.300 índios vigiarem constantemente. Os suruís perderam 7% de sua floresta, mas salvaram 93%. É deles a última área de floresta nesta parte de Rondônia, onde 4 mil pessoas ainda vivem da indústria madeireira.
“Mas vamos começar do início”, diz o cacique. “Vamos para Lapetanha.”
Nós entramos em sua picape e ele dirige passando por postos de gasolina, ferros-velhos e hotéis que alugam quartos por hora. Posteriormente vemos plantações de soja, banana e rebanhos de vacas pastando em campos cheios de tocos de árvores queimadas. “Tudo isso já foi nossa terra”, ele diz de forma serena e modesta. Ele não se recorda de como era a aparência. Afinal, a floresta já tinha desaparecido quando ele deixou sua aldeia pela primeira vez aos 14 anos. Ele também não se lembra muito da luta de seu pai, que ajudou a expulsar os colonos da reserva –ele armado com arco e flechas, eles com armas. “Eu apenas me lembro do medo”, diz Almir Suruí.
O medo é tudo o que resta. Pessoas à margem da estrada olham enquanto passa o carro de Almir e elas parecem cada vez mais hostis quanto mais nos aproximamos da reserva. Muitas dessas pessoas são madeireiros que costumavam viver na reserva. Há três anos os madeireiros e donos de serrarias ofereceram US$ 100 mil pela cabeça dele e o cacique foi forçado a fugir para os Estados Unidos.
Dois mundos
Em um mundo, Almir Suruí tem duas esposas, uma em Cacoal, a outra em Porto Velho, assim como cinco filhos, uma casa com quintal e um dachshund. Neste mundo, ele é semelhante a um ministro das relações exteriores dos índios da Amazônia. Ele já visitou 26 países, esteve nas Nações Unidas em Nova York, participou da cúpula do clima em Copenhague e já teve uma audiência com o príncipe Charles, em Londres. Al Gore pretende lhe fazer uma visita no futuro próximo. Em dezembro, a revista brasileira “Época” o elegeu um dos 100 brasileiros mais importantes, juntamente com o astro de futebol Kaká, a modelo Gisele Bündchen e o escritor Paulo Coelho. Ele é membro de duas comissões do governo, e durante as eleições deste ano ele disputará uma cadeira no Congresso pelo Partido Verde.
Seu outro mundo é Lapetanha, o local onde nasceu na reserva, a aldeia onde foi eleito cacique aos 17 anos porque seu pai foi cacique antes dele e talvez por também sentirem que ele tinha algo especial. Neste mundo, as pessoas comem larvas e a eletricidade só chegou há quatro anos. Aqui ele pinta pontos e linhas no rosto e no corpo durante festivais religiosos, cujas marcas podem ser vistas como leves manchas azuis brilhando em sua pele.
Este é o mundo que foi abalado pela modernidade há 41 anos, quando operários abriram uma trilha pela floresta como prelúdio para a construção de uma rodovia. Essa estrada trouxe consigo colonos, gado, carros e telefones. Hoje, em muitas aldeias é possível encontrar um freezer horizontal no qual os índios guardam os porcos do mato caçados com arcos e flechas.
Harmonia perdida
Este outro mundo começa no fim dos campos onde a floresta repentinamente volta a ser densa. Apenas uma trilha estreita leva à uma aldeia composta de poucas cabanas, uma escola, uma igreja, três computadores e 102 habitantes. Almir Suruí estaciona sua picape do lado de fora da casa de madeira de seus pais. Marimop, seu pai de 87 anos, está deitado em uma rede vestindo uma camisa verde e calção laranja. Sua mãe está de cócoras no chão fazendo furos na casca de um tatu.
Ambos possuem duas linhas azuis atravessando seu rosto. O pai de Almir explica que é o símbolo dos suruís e que todos os homens e mulheres costumavam ter essa tatuagem. “Mas os jovens não a querem mais.” Eu pergunto o que mudou desde que seu povo teve o contato involuntário com o mundo exterior. “Os espíritos costumavam manter a floresta e o clima em harmonia”, explica o velho. “Mas os espíritos não são mais como costumavam ser na época da grande tranquilidade.” Em outras palavras, antes de 1969.
A perda da tranquilidade foi acompanhada da perda da tradição, principalmente do orgulho. Forasteiros zombavam que os suruís eram estúpidos e indolentes e estes ficavam embaraçados em chamar a si mesmo de indígenas. Desde então eles não têm medido esforços para parecerem o mais brasileiros que podem. Sempre que viajam para a cidade, eles vestem camisas cuidadosamente passadas e sapatos meticulosamente lustrados. Aqueles que podem cobrem seus terraços com telhas. Um punhado até mesmo possui carro. E a pessoa mais importante na aldeia não é mais o pajé, mas um homem da Alemanha. Toda quarta-feira, o missionário vai à aldeia para pregar –apesar de que em grande parte apenas o Apocalipse e o Gênese, porque pouco mais do que isso foi traduzido.
Olhando para o chefe sentado entre seus pais, é possível imaginar o salto enorme que ele deve ter dado para se aventurar no outro mundo alienígena. Almir foi o primeiro suruí a ir para a faculdade. Ele estudou biologia em Goiânia, uma cidade de 1,2 milhão de habitantes, onde os demais estudantes o ignoravam porque ele não falava, parecia ou comia como eles. Almir só comia carne levemente cozida, de preferência de porco, e nada de verduras, legumes ou molho. Apesar dos suruís terem se adaptado de muitas formas, seus hábitos alimentares não mudaram.
Tecnologia e tradição
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O jovem suruí acabou buscando refúgio na Internet e se juntou à batalha contra o Banco Mundial e seu projeto de desenvolvimento Planafloro, que previa a construção de novas estradas, represas e assentamentos em terras indígenas, mas ignorava a população indígena local. Os índios reagiram contra o Banco Mundial e venceram. Quando o cacique retornou à aldeia, ele trouxe consigo um computador e uma ideia: a de que a única esperança de sobrevivência dos suruís estava na combinação de dois mundos, o da tecnologia e da tradição. Foi o amanhecer de uma nova era.
O pai de Almir ainda caça de arco e flecha, enquanto Almir agora tem um iPhone. “Eu reverencio a tecnologia moderna”, ele diz. Soa como uma profissão de fé. Apesar da falta de sinal, ele segura seu iPhone na mão e não solta. Ele olha para a tela sem resposta, desejando checar seu e-mail, navegar na Internet e fazer uma busca por seu nome no Google, o que ele faz com frequência, sempre que está entediado. Ontem ele gerou 49.600 resultados. Isso lhe dá esperança, ele diz, porque você não desaparece tão rapidamente se tiver 49.600 resultados de busca. Ele possui cinco endereços diferentes de e-mail e 324 amigos no Facebook. Um deles é outro ameríndio, Evo Morales, o presidente da Bolívia.
Almir Suruí, o índio da floresta Amazônica, agora é famoso.
Tudo começou em 1997, o ano do Protocolo de Kyoto. Almir Suruí tinha 22 anos quando concebeu um plano de 50 anos que era tão simples quanto genial: os próprios suruís curariam as feridas provocadas pelos madeireiros em sua reserva. E em 50 anos sua floresta voltaria a ser como era. Almir acredita que esta é a única esperança de sobrevivência da tribo, porque sempre existiram suruís dispostos a cooperar com a máfia madeireira, alguns para escapar da pobreza, outros por pura ganância.
Um e-mail do coração da floresta tropical
As palavras do cacique convenceram quase todos os suruís, que começaram avidamente a cultivar e plantar mudas. Aos poucos a floresta retornou. Ignorando a chuva e o calor, eles plantaram mais e mais espécies: palmeiras açaí, ipês, castanheiras-do-pará, mogno. Mulheres, crianças e idosos, todos deram uma mão, cortando o mato que parece floresta, mas que não é nada mais que arbustos, palmeiras e samambaias. Eles continuam plantando até hoje.
Entre os suruís se encontra um homem com braços marcados por picadas de mosquitos, vindo da Suíça; Thomas Pizer, da organização Aquaverde. Pizer lembra de como recebeu um e-mail de Almir Suruí, há seis anos. A mensagem dizia: “Em seu site é dito que vocês estão envolvidos no reflorestamento da Amazônia. Se for verdade, por favor, nos ajude”. Documentos do Word e planilhas do Excel estavam anexados ao e-mail. “Eu recebi planilhas de Excel do coração da floresta tropical!” diz Pizer rindo. Ele fez uma transferência de dinheiro aos suruís, suficiente para 500 mudas. Eles plantaram 1.900. “Nenhum outro povo indígena em todo o Brasil fez tanto pela recuperação de suas florestas”, ele diz.
Até o momento os suruís plantaram 120 mil árvores. Outras 40 mil estão planejadas para este ano. Mas apesar de todos os seus esforços, eles ainda estão distantes do sonho de Almir de 1 milhão de novas árvores –em parte devido às tentativas persistentes de extração ilegal de madeira. Almir pega um pedaço de papel e rabisca a reserva suruí. Ao lado dela ele desenha um círculo. “As autoridades deram aos madeireiros uma licença para cortar árvores nessa área”, ele explica, apontando para o círculo. “Mas não restam mais árvores lá, então eles entram em nossa reserva e então alegam que as árvores foram cortadas legalmente.”
Um índio visita o Google
Na semana passada, ele pegou alguns madeireiros ilegais enquanto estavam prestes a escapar com três caminhões carregados de mogno. Os caminhões pertenciam às autoridades regionais do Estado vizinho do Mato Grosso. “O prefeito está envolvido. Isso é típico por aqui”, diz Almir. Ele perdeu a fé no governo brasileiro e em seu plano de redução do desmatamento em 80% até 2020. Almir Suruí, o cacique da floresta, agora acredita apenas no poder do conhecimento.
Assim, há três anos ele contatou a empresa com maior depósito de conhecimento: o Google. Usando um cocar de penas na cabeça, ele entrou na sede global da empresa em 1600 Amphitheater Parkway, em Mountain View, Califórnia, exigindo uma reunião. Eles lhe concederam 30 minutos –e passaram três horas conversando com ele. Poucos meses depois, o Google foi a Lapetanha armado com laptops, telefones por satélite, câmeras e projetores. E os suruís realizaram sua primeira busca a respeito do mundo na ferramenta de busca do Google: “Desmatamento Amazônia”.
Eles gravaram um vídeo para o YouTube, construíram um site e aprenderam o significado de palavras como “blog”, “overlay” e “3D’. Eles até mesmo inventaram uma palavra para Google em sua própria língua tupi-mondé: “ragogmakan”. Sua tradução literal é mensageiro, porque o Google leva a mensagem dos suruís e o plano deles para o mundo.
Usando o Google para caçar intrusos
O cacique espera digitalizar plenamente a reserva algum dia. Eles já estão trabalhando no primeiro passo: eles querem integrar um mapa produzido por eles mesmos de sua floresta no Google Earth, onde as pessoas poderão consultar fotos, realizar um sobrevoo virtual pela reserva e assistir vídeos dos anciões da tribo falando sobre suas tradições. Enquanto isso, na cabana de folhas de palmeira no chão da floresta, suruís ficarão sentados diante de computadores analisando imagens de alta resolução por satélite de sua floresta, à procura de intrusos, imagens que o satélite chinês-brasileiro CBERS III fornecerá em breve.
Até lá, eles vão se virar com as imagens por satélite do Google Earth. Apesar de sua baixa resolução, as imagens foram boas o suficiente para identificação de dezenas de lugares onde madeireiros e garimpeiros ilegais penetraram e foram expulsos de novo. Muitas toneladas de madeira foram confiscadas. Tem sido uma amostra do que virá, do futuro que eles esperam que chegue em outubro, quando os suruís entrarão para o mercado global de emissões.
Almir Suruí ouviu pela primeira vez o termo REDD –ou “retchi”, como ele pronuncia– há três anos. É a sigla para Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação. Ele descobriu que as floresta prendem o dióxido de carbono e que empresas de todo o mundo estão dispostas a pagar muito dinheiro para que árvores absorvam dióxido de carbono em nome delas. Eles não pagam por uma floresta que apenas existe, mas sim pela prevenção de sua destruição.
A floresta poderia desaparecer até 2100
Os suruís encomendaram uma simulação do que aconteceria se não protegessem sua reserva: o “cenário dos negócios como de costume”, para usar o jargão REDD. Para os suruís, os negócios como de costume resultariam no desaparecimento de 30% de sua floresta no espaço de 50 anos. No final do século, ela poderia desaparecer totalmente.
Balançando em sua rede e comendo uma costela da porco do mato, Almir Suruí apresenta um valor alto: US$ 120 milhões. Esse é o preço para proteção de sua floresta por 44 anos, impedindo assim o lançamento de 16.475.469 toneladas de dióxido de carbono na atmosfera. Os possíveis compradores desses “créditos” são empresas dispostas a negociar voluntariamente as emissões, assim como bancos de investimento, corretoras e até mesmo governos. O Estado americano da Califórnia seria um desses candidatos, porque prometeu reduzir sua produção de CO2.
O cacique indígena está ciente das críticas ao REDD. Os críticos dizem que é complicado demais, que a Mãe Natureza não deveria ser guiada pela lógica dos mercados de capital, que dinheiro demais é perdido em taxas de transação. Além disso, está longe de certo que o REDD realmente ajudará a proteger o meio ambiente.
Todavia, se tudo correr de acordo com o plano, o REDD poderia devolver parte do orgulho perdido aos povos indígenas do Brasil e fazer o mundo levá-los mais a sério. Os suruís poderiam se tornar um modelo para como os ameríndios poderiam ganhar dinheiro e viver em harmonia com sua floresta.
O plano de negócios suruí
Os suruís querem usar parte do dinheiro para construir novas casas para eles mesmos e plantar ainda mais árvores. Eles também gostariam de um hospital, de uma escola melhor, de computadores para todos e pensões para os idosos e enfermos; um miniestado de bem-estar social para os suruís. O restante dos milhões que esperam obter no mercado de emissões seria aplicado em um fundo com o qual comprariam empresas e trariam empregos para a região, algo que também beneficiaria seus inimigos, os madeireiros ilegais.
O cacique fala sobre um plano de negócios, sobre o café suruí, lucro e ativos de capital. Ele fala como um empresário –exatamente o que ele será no futuro próximo. Ele e outros suruís agirão como o conselho supervisor do fundo, uma entidade que ele presidirá. Quinze suruís atualmente estão estudando administração, biologia e turismo para que possam administrar o negócio.
Os jovens esperam que o mercado de emissões traga o futuro para sua aldeia. Os idosos esperam que traga a tradição de volta à aldeia.
Almir sente que será um ato delicado de equilibrismo. Ele transformou os suruís em índios high-tech, mas ao mesmo tempo ele quer que preservem sua cultura. Ele diz que às vezes se desespera e teme que os dois mundos não combinem. “Mas qual é a alternativa?” Ele dá de ombros. Não há nenhuma.
Floresta no deserto?
Naquela noite, o velho mundo e o novo podiam ser vistos lado a lado na aldeia. Uma cortina espessa de chuva está caindo. Em uma das cabanas, um laptop está sobre uma cadeira. Ele mostra um vídeo gravado durante o festival Mapimai, a celebração da criação do mundo. As festividades exibem uma disputa entre dois clãs. Eles se pintam, vestem penas decorativas e então veem quem consegue beber mais chicha, uma cerveja de milho. Na tela, homens cambaleiam, riem, balançam juntos e vomitam. As crianças da aldeia ficam sentadas diante do laptop, rindo. Em seguida é exibido um vídeo de Almir fazendo seu discurso na Cúpula de Copenhague.
O cacique está sentado ao lado delas, perdido em pensamentos. As lembranças de Copenhague são coisa do passado. Ele já está pensando em seu próximo plano. Uma empresa de Abu Dhabi, nos Emirados Árabes Unidos, ligou para ele para perguntar se seria possível cultivar uma floresta tropical no meio do deserto. Almir sabe que Abu Dhabi é um país feito de areia. Mas ao longo do Golfo Pérsico, eles já construíram o prédio mais alto do mundo, uma ilha em forma de palmeira e uma rampa de esqui. Por que não uma floresta tropical?
Almir disse que precisaria de US$ 15 milhões –e, é claro, um salão cercando a floresta– para completar o projeto. Os suruís administrariam o empreendimento e o dinheiro dos ingressos seria usado para recomprar as terras que cercam a reserva, terras que antes pertenciam a eles.
Almir Suruí sorri. Passados 13 anos de seu plano de 50 anos, suas ideias certamente não se esgotaram. Na verdade, ele está apenas atingindo sua melhor forma.
Tradução: George El Khouri Andolfato
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